sábado, 21 de março de 2020

Diário de quarentena - Dia 9

21 de março de 2020 - 09:30

Fazem 9 dias desde a paralização da Uninove - Campus São Bernardo do Campo por conta do Corona vírus. Ontem (20 de março de 2020) o Ministro da Saúde do então governo, Madetta, afirmou que a partir de abril o sistema de saúde entrará em colapso. Eu acho engraçado como o Brasil ainda não se tocou da realidade. Mas olhando por um lado realmente não parece realidade mesmo. Parece que ainda vou acordar amanhã, pegar um ônibus, voltar pra SBC pra assistir aula presencial com meus amigos enquanto massageio os pés da minha amiga da cadeira da frente... Mas não vai rolar.
Voltei pra minha cidade há 3 dias (17 de março), bem no primeiro pico de quarentena. O povo ainda não respeita muito, assim como não respeita ninguém praticamente. Remédios para LUPUS que supostamente - graças ao atual presidente dos EUA, Donald Trump - teriam eficácia contra o COVID-19 foram retirados das prateleiras por pessoas desesperadas por uma cura ou uma proteção. Isso acabou por fragilizar ainda mais a população que dependia desse remédio por exemplo. O Brasil ainda não tem dimensão do que está acontecendo. E nem eu tinha.
Ontem (20 de março), além da fala do Ministro da Saúde, o biólogo Átila Iamarino fez a segunda live sobre o corona e os próximos passos. A minha ficha parece ter começado a cair vendo o futuro distópico que antes só acreditava em Residente Evils, The Walking Dead e afins, tomar forma na minha frente. 1 milhão de mortos no Brasil caso não façamos nada. Caso descumpramos com o toque de recolher. E milhares caso cumpramos.
É aquele famoso 8 ou 80 que usamos para qualificar pessoas intensas de sentimento por exemplo. Ou vai ou racha, sabe?
Eu estava desesperado por estar ficando em casa o dia todo, e na minha cabeça sair um pouco na rua não faria mal. Afinal, havia pessoas fazendo o mesmo ainda. Tanto que minha felicidade ao ser chamado pelo meu pai pra ir ver uma de nossas casas de aluguel que estava em obra foi insana. Eu só queria sair de casa um pouco e fiquei extremamente feliz por dar uma volta. Mas o mundo já havia começado a mudar e eu ainda não tinha caído a ficha. Na obra, 3 senhores já de idade trabalhando pra garantir o dinheiro que os ajudaria a passar mais um pouco de tempo isolados quando tudo caísse. Somado a isso, a pergunta de um deles sobre a casa já estar alugada me fez enxergar aquela reforma como uma nova cela para uma possível família passar os próximos meses dessa pandemia. Minha ficha começava a cair. A esperança que eu tinha de semana que vem as coisas melhorarem um pouco, de uma vacina logo estar pronta. É, a realidade começou a cair. E a bomba real estava pra chegar.
Voltamos pra casa e meu pai e eu fomos assistir a Fullmetal Alchemist Brotherhood, que eu comecei a introduzir a ele, eu simplesmente amo essa série, quando ele pediu para ver o jornal. "Em abril o sistema de saúde estrará em colapso.", aquela frase ecoou na sala e eu não dei o devido peso a ela. Ainda estava na minha pequena ilusão de que tudo ficaria bem, que logo isso tudo ia acabar tipo mês que vem e meus amigos e eu estaríamos rindo dos stories no Instagram da galera fazendo qualquer tipo de coisa pra passar o tempo na quarentena. Mas então a Bê me veio de novo na cabeça. É. Há 3 semanas ela não parava de vir na minha cabeça, e quando me dei conta, estava perguntando a todos os meus amigos se eles haviam conseguido voltar pra casa.
Eu queria muito saber dela, mas me contive ao máximo que pude. Agora ainda mais não era hora disso. A live do Átila foi anunciada no YouTube e aquilo seria meu divisor de águas. Mas ainda não era a hora. A notícia do ministro ainda estava no ar. E eu conversando por insta e whasapp com todos com quem eu podia. Isa me veio a mente também, e quando dei por mim, estava pensando em como todas elas poderiam estar. Aninha, Elisa, Isa. Mas a Bê era a que mais me vinha na cabeça. Rezei. A live começou.
- "Eu preciso levar um assunto muito sério com vocês nessa live. A sua vida JÁ mudou.", entre pausas e gráficos e respiros, do modo mais didático possível, o Átila tirava meu chão.
Sentados, os 3 - minha mãe, meu pai e eu - no sofá absorvendo toda aquela realidade, eu me vi desesperado. Meu mundo acabara de cair, literalmente. Não sei o que virá no DC (Depois do Corona), mas com certeza o AC (Antes do Corona) agora já é passado. Muito do que eu vivi eu não vejo mais como pode retornar. "Roupas de grife", "Jogadores bilhonários"... Eu me sinto naquele filme, O Livro de Eli, quando ele explica que no tempo dele gastávamos sem ligar. Jogávamos fora coisas que hoje são essenciais.
Enquanto o Átila falava minha vida toda passava pela minha cabeça. Tudo o que eu havia vivido até ali parecia tão longe agora. Tudo, TUDO, vai mudar. Já começou a mudar. A economia mundial vai sofrer drasticamente. Pessoas vão morrer em todo o mundo pelo coroado e nós ainda não estávamos encarando a siuação com a seriedade real da coisa.
Assim que a live terminou, minha mãe, meu pai e eu discutimos por mais 1h inteira sobre tudo que havíamos absorvido. Eu só conseguia pensar em como tantas pessoas não iriam conseguir tratamento. Muitas irão morrer. Muitas estão na linha de frente, enfrentando o vírus como minha amiga Drielly. E não há o que fazer por enquanto. O mundo que vai surgir após esse vírus, eu quero muito conhecer, porque eu não sei o que nós ainda vamos passar. O Brasil pode mudar tudo. Podemos até mesmo sair como uma nova potência depois dessa calamidade. Mas muita gente ainda vai morrer...

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