segunda-feira, 3 de junho de 2019

Um roteiro sobre o fim.

03/06/2019

Eu nunca pensei que esse dia realmente chegaria, mas quem diria, aqui estou eu errado de novo. Acho que pelo meu extremo apego às coisas eu tento ao máximo manter tudo que tenho. Me agarro à memórias de momentos que já se foram. Principalmente os ruins. Mas esse eu acho que é um momento de dizer adeus a uma coisa muito boa, infelizmente.
Sim, esse texto é sobre o fim da medicina na minha vida. Em 2009 ela entrou como um "sonho" adolescente implantado por uma sociedade que parece ver apenas vangloriar certos cargos e posições sociais. E desde pequenos somos doutrinados a ver um médico ou um advogado como o ápice de toda e qualquer sociedade. Mas acho que pra mim já deu.
Em 2011 eu creio que tive um vislumbre do que talvez me fizesse feliz, e fui para a faculdade de Cinema. Amo cada segundo que estive lá, assim como sinto falta dos mesmos. Me arrependo por não ter levado a sério como devia. Me arrependo de ter dado as costas a várias pessoas por motivos infantis. E me prendo muito a isso. Me sinto culpado por não ter arranjado um emprego. Não ter saído da casa dos meus pais. Não ter encontrado um rumo.
Em 2015 a medicina tornaria a entrar em minha vida, dessa vez mais forte, por meio de um novo amor. E ela me incentivaria, e eu incentivaria a ela, pois nunca foi realmente MEU sonho. Era o sonho DELA. E eu queria que ELA o realizasse. Queria vê-la feliz fazendo o que mais ama. E assim me engajei a ajudá-la a conquistar esse sonho. Mas aquilo me consumiria de tal forma que, ainda escrevendo esse texto eu me recuso a aceitar que seja verdade. Abri mão de amigos. Abri mão de planos. Abri mão de sonhos. Abri mão dela. Abri mão de alguém que sequer chegou a poder criar algo que meu coração implorava para existir. Mas ganhei a medicina. Ganhei a aprovação da sociedade. Ganhei um cargo que me daria status. Que grande merda.
Troquei minha cidade por uma nova, mas não pela medicina. Troquei por uma fuga. Troquei por uma chance de começar do zero. Buscando alguma coisa que me faria, sei lá, me reencontrar, me amar outra vez. Me realizar.
Mas desde 2018, quando ingressei na faculdade só me vejo sendo sugado até a última gota. Conheci pessoas incríveis, e outras que me fizeram aprender muito mais do que eu queria. Talvez eu deva mais a essas pessoas que retiraram minha energia do que estou dando o devido crédito, pois elas estão me ajudando a tomar essa decisão mais do que qualquer outra coisa.
Quando me mudei, vim de coração partido. Carregando um amor não correspondido. Pensamentos sobre terminar com minha vida. Arrependimentos, principalmente pelos pensamentos suicidas. Vim buscando redenção. E o que encontrei aqui foram mais perguntas. Uma falsa liberdade.
Se tem uma coisa que eu aprendi muito com a medicina, foi a mentir. Mentir para mim mesmo que estou bem. Mentir para meus pais que estou bem. Mentir pra minha mãe sempre que ela me atualizava com exames. Descobri que meu pai é um dos maiores mentirosos do mundo. E eu o admiro por ainda se manter forte. Ainda se manter íntegro. Não é fácil ter de olhar nos olhos de alguém que está morrendo, sorrir e dizer: "Relaxe, tudo está caminhando bem"...
E isso te corrói muito. Eu não quero mentir pra mim mesmo mais. Não sei se abrir mão desse curso realmente é o que eu quero, ou se estou me apegando a ele simplesmente porque é Medicina. Sei que estou infeliz. Estou esgotado. Estou perdido. Amo muito as pessoas que entraram em minha vida, mas sinto que está chegando no fim. Tudo isso passa e eu preciso aprender a seguir em frente. Deixar o que foi pra trás, e ver o novo. Ser feliz.
Pensar em desistir de tudo, T2B, T2, MedSBC, me dói demais. Mas ainda assim trás certo alívio. Desde o começo eu sempre fui o deslocado, diferente. Meu jeito de ver as coisas não combinam em nada com o modo que estão levando tudo ali. Talvez eles estejam errados e ainda verão. Talvez eu ainda queira apenas estar certo, e não ver a realidade das coisas. Casa é um lugar onde nos sentimos pertencentes, e infelizmente eu não me sinto mais pertencente a este lugar. Essa faculdade. Talvez esse seja o sinal para parar de insistir em algo que nunca deveria ter sido, e continuar buscando o que realmente deverá ser.
Entre tantos talvez, a vida continua me cobrando um posicionamento. E eu acho que estou pronto pra tomar uma decisão.

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